segunda-feira, 10 de novembro de 2014

O Curso de Literatura de Autoria Feminina mergulha nos Mistérios Eleusinos:
Louca Deméter que pranteou o rapto de Perséfone até a terra secar. Mas Elêusis a acolheu como a deusa precisava, primeiro disfarçada como uma velha que na calada da noite cuidava do menino até ser descoberta pela zelosa Metanira. Vamos juntas a Elêusis agora, até porque é impossível ir a Elêusis sozinhas, vamos juntas então, descobrir os mistérios eleusinos. E para isto, de um universo de 50 romances selecionados, vamos ler e discutir dois por mês, e teorias sobre as mães e as filhas, o par excluído da cultura dos homens, para recriarmos juntas os mistérios eleusinos. O que sentia Deméter ao prantear o sumiço da sua menina e Cora, a pequena Perséfone, o que realmente aconteceu com ela para que pudesse reinar nos infernos tão soberana e longe da mãe? Os trabalhos estão abertos, meninas, juntem-se a nós. O tema são as complexas relações entre as mães e as filhas, e mais, muito mais, já que estas duas falam de outras coisas, das transformações, da vida e da morte, e dos segredos das almas das mulheres.
Começamos com "Bondade" da canadense Carol Shields e "La llorona" da chilena Marcela Serrano.





“Demeter” e “La Llorona”, por Laís Rodrigues de Oliveira.

Seu verdadeiro nome agora é mãe. Não importa mais como seus pais lhe chamaram. Nem se lembra do seu nome de casada. Esqueceu-se do apelido da adolescência.  Somente sabe, quer saber, importa-se em saber que é Deméter, a mãe cuja filha foi-lhe tomada à força. Marcela Serrano batizou-a de Llorona, a mãe eternamente em busca de sua pequena perdida, levada de seus braços, de seu ventre, de seu peito.
A perda da filha fez os campos de Deméter secarem. As folhas caíram, as flores murcharam, a terra perdeu sua fertilidade. Sem qualquer interesse em sua casa, em seu marido, em seu vilarejo, la Llorona partiu em busca de sua menina. Buscou nas margens dos rios assassinos de seu país. Disfarçada, para não ser reconhecida por seus malfeitores, Deméter vasculhou cada pedra, cada canto, cada possível esconderijo, em busca de sua luz roubada. Não a encontrou. Porém, deparou-se com outras Deméteres e Lloronas, igualmente em busca de suas próprias crianças perdidas.
Junto com suas novas companheiras, construíram jardins nas beiras das margens, cujas flores, cada vez mais numerosas, vigiariam ininterruptamente os perversos ladrões, em busca dos pequenos desaparecidos e evitando novos roubos. As jardineiras revezavam-se para cuidar das belas – e crescentes – plantas. Por vezes era Olívia, outras era Flor, de vez em quando Jesusa e até mesmo Elvira ajudava. Depois de um tempo, muitas daquelas mudas tornavam-se flores poderosas, criavam suas raízes, saíam da terra onde foram depositadas com a dor da perda, e passavam a ser novas jardineiras.
Quando havia mais jardineiras que jardins, os miúdos inocentes deixaram de cair dentro do rio, deixaram de ser levados pela correnteza infinita, longe das margens de onde vieram, longe de suas mães. Foi na mesma época em que nossa Deméter, a primeira rosa a surgir naquele deserto sem fim, encontrou, enfim, sua Perséfone. Ela estava muito maior do que aquela criatura do tamanho de uma caixa de sapatos que um dia fora. Perséfone tornara-se um reflexo da própria Deméter, e a mãe eternamente esperançosa reconheceu-a de imediato.
Lutou contra o poder de Hades e as forças do submundo, mas finalmente conseguiu trazer sua pequena de volta para o seu lado. Mesmo sabendo das dificuldades que seria conquistar o amor da filha que fora criada como uma rainha, quando ela própria poderia lhe oferecer pouco em termos materiais, sabia que o que lhe daria seria muito mais que seus sequestradores poderiam jamais lhe oferecer. O amor infinito de uma mãe que nunca desistiu de encontrá-la.

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